"Multiplicando Referências"

Lição escrita e Ministrada por Alexandre Vilmar nos dias 24 de fevereiro e 03 de março. Alexandre é Membro do Conselho de Ensino da ORLASG.



INTRODUÇÃO
 O capítulo 18 do livro de Êxodo retrata uma valiosa lição de administração, uma situação vivida por volta de 1.500 AC com a saída do Egito, mas que se faz tão atual, e pode ser aplicada nas mais diversas áreas de nossas vidas (profissional, eclesiástica, familiar etc).
Depois de confrontar e derrotar faraó, Moises tem mais um grande desafio pela frente: conduzir mais de 600.000 famílias (estimadas em 2000.000) de pessoas em meio ao deserto em direção a terra prometida. De acordo com a própria bíblia, Moisés contava com a ajuda de Deus que cuidava da parte logística, provisão de alimentos (Ex 16:12-16) e da água (ex 15:26), cuidava também da orientação do povo (Nm 9:17), entretanto cabia a Moisés lidar com as questões voltadas as relações humanas de um povo que contava com um histórico de 400 anos de cativeiro e que agora se encontra livre, porém no deserto, lugar desconhecido, com a expectativa de conquistarem uma nova terra, que lhes havia sido prometida, mas que não sabiam como chegar, pois não conheciam a rota, ou seja, não tinham domínio algum sobre qualquer situação. Eles estavam livres e sem direção.
Neste cenário Jetro visita Moisés com o intuito de devolver-lhe a família (esposa e filhos), e observa que Moisés estava muito ocupado, pois todo o povo vinha ter com ele para julgamento de todas as causas fossem elas grandes ou pequenas.  Moisés se mostrava extenuado com tal situação e mesmo assim não dava conta do julgamento de todas as causas. Jetro indaga a Moisés: “O que é isto que fazes ao povo? Porque te assentas só, e todo o povo está em pé diante de ti, desde a manhã até o por do sol?” (Êxodo 18:14), antes mesmo da resposta de Moisés, o sogro respondeu: “Não é bom o que fazes. Sem dúvida desfalecerás assim tu, como este povo que está contigo, pois isto é pesado demais para ti: tu só não o podes fazer.” (Êxodo 18:17-18).
Jetro aconselha a Moisés a ver quais deveriam ser suas reais funções (cuidar dos princípios e estatutos vindos de Deus) e como tratar as demais situações. Deveria designar pessoas retas para fazerem o julgamento segundo estes princípios. Moisés seria o “Superior Tribunal de Justiça” nas questões que os seus escolhidos não estivessem capacitados a resolver. E Jetro complementa:
“Se isto fizeres, e assim Deus to mandar, poderás então suportar; e assim também todo este povo tornará em paz a seu lugar.” (Êxodo 18:23).

O FORMATO DE LIDERANÇA DE MOISÉS  - UM MODELO CENTRALIZADOR

É fácil observar que o modelo utilizado por Moisés é um modelo de liderança centralizada, onde todas as questões são decididas por um único líder (Ex 18.13),  nenhuma outra pessoa participa ou contribui no trabalho que ele faz. O que não significa dizer que não haja gente competente, mas o problema desse líder é sua visão, que não lhe permite perceber diferentes ângulos da realidade e da necessidade em que está inserido. Ele é o centro e o único referencial de tudo o que acontece.
Neste modelo o líder apresenta algumas características:
1) Solitário – (Ex 18:14):  Não confia que alguém possa contribuir para o trabalho que faz, ele não quer correr o risco de se abrir ou repartir. Isto o distancia dos outros e o torna inacessível enquanto líder.

2) Má administração do tempo ( 18:14): A agenda está sempre lotada - “de manhã até o por do sol”. Não paramos para pensar e avaliar se o que estamos fazendo (eficiência) é o que deveria ser feito (eficácia). Ele não tem tempo para sua família, para férias, para o descanso. Não consegue tirar sequer uma soneca por que sabe que existem centenas de pessoas de forma desconfortável no calor do deserto, esperando por uma palavra sua.

3) Adota um modelo INEFICAZ de liderança - 18:14; “o povo de pé, aguardando ser recebido”. Por estar , por mais que ele faça, surgem lacunas graves. O povo não consegue ser atendido a contento simplesmente porque Moisés não tem condição física de atender todos, conversar com todos e orientar a todos. Este modelo exaure o líder, e não resolve o problema do liderado.

4) Negligencia a família – Não se consegue equilibrar a atenção necessária à família e as múltiplas solicitações que uma agenda lotada causa em nossa vida. Em geral, quando estamos trabalhando excessivamente, uma das áreas que mais enfraquece é a do relacionamento familiar.

Bases de sustentação do modelo centralizado
1) Falso conceito de espiritualidade - “o povo vem consultar a Deus por mim” (Ex 18:15). Em outras palavras Moisés pensava que apenas ele tinha a orientação de Deus para este ministério, acreditava que se ele não fizesse, ninguém mais o faria? Jetro demonstra que esta espiritualidade de Moisés era falsa. De fato Deus lhe dera as diretrizes, mas se Moisés treinasse outros homens, estes tais teriam acesso às mesmas informações que ele possuía. Ele mantinha as informações consigo, isto o fazia espiritual diante dos outros. Aliás, o problema da super espiritualidade sempre foi uma tentação para Moisés (2 Co 3.13).
“Desde quando uma úlcera hemorrágica é sinal de espiritualidade? Deus deseja que nosso estilo de vida seja mais fácil. Não é espiritual ter uma aparência esgotada, sacrificada pelo excesso de trabalho. Desde quando não ter nenhuma hora de folga e uma semana de 70 horas são marcas de eficiência?”
2) Onipotência (o poder de fazer tudo) – convencer a si mesmo que somente você pode fazer o trabalho. Este tipo de líder teme ser descartado ou perder a primazia.

VISÃO DE JETRO
Jetro percebe os erros administrativos de Moisés e questiona seu modelo. Seus conselhos são bons e Moisés resolve acatá-los.  A visão de alguém de fora pode fazer grande diferença em nossos projetos, aprendemos mais uma vez com Moisés que “ouviu atentamente” os conselhos de Jetro, refletiu e tomou a decisão acertada. Jetro abordou os pontos que necessitavam de mudanças:
1) Motivação correta – Método inadequado – muito gasto energético para um benéfico muito pequeno ou quase nenhum.  O perigo do isolamento é comum em grandes líderes.
2) Centralização de decisões – Desgaste no campo emocional / físico
- Tanto para o líder: Jetro acentua este último: “Certamente desfalecerás...” (Ex 18.18). Este texto foi escrito em hebraico e originalmente a palavra que aqui foi empregada significa: “envelhecer antes do tempo, exaurir”. Quem se acha tão espiritual ou tão onipotente que não possa delegar, morre sem deixar uma liderança preparada para a continuidade do projeto.
- Quanto para o povo:"Sem dúvida desfalecerás, tanto tu como este povo que está contigo" (Ex 18.18). O líder precisa entender que boa liderança não afeta apenas a si, mas afeta outros.  Líderes devem desejar o bem da empresa ou da instituição. Se você é líder comunitário, tal comunidade deve ser o objeto de sua preocupação, não existe ninguém que possa fazer um trabalho significativo se não deseja o bem do projeto pelo qual trabalha. Jetro mostra a Moisés que o seu projeto de liderança atrapalhava e prejudicava a vida daquele povo. Não é boa liderança aquele que prejudica quem é liderado, e Jetro demonstra o desgaste que a liderança de Moisés estava causando ao povo.
3) Não superestimar sua capacidade – é necessário avaliar sua capacidade, esta é outra exortação de Jetro. “Isto é pesado demais para ti!” (Ex 18.18). Não dá para ser eficiente quando a tua carga é maior que sua capacidade. Mesmo que sejamos competentes, dinâmicos e com grande poder de conexão, não podemos fazer mais que nossas condições físicas e emocionais permitem.
4) Entender a necessidade de aliados - “Tu só não o podes fazer” (Ex 18.18). A tarefa em equipe não é somente lógica, é também bíblica. Ao analisarmos o modelo de liderança de –
- Jesus: Investiu nos doze apóstolos e preparou estrategicamente um grupo menor. Ao enviá-los de dois em dois, no grupo dos setenta, deu instrução especifica a todos eles (Lc 10.1-24).
- Paulo: fez parceria com Barnabé e a João Marcos (At 13.13), depois, com Silas (At 13.40) e Timóteo (At 16.1-3). Por sua vez, Barnabé, que se separara de Paulo, continua seu projeto com João Marcos (At 13.39).

UM NOVO MODELO DE LIDERANÇA – LIDERANÇA DESCENTALIZADA
 Jetro propôs alguns princípios simples, mas que foram de grande importância para a liderança de Moisés:

1) Entender qual sua tarefa - “Representa o povo perante Deus, levar suas causas a Deus...”. Ex.18:19-20 Na verdade Jetro está dizendo: "  as outras tarefas, deixe que outros façam.n A tarefa não deixará de ser realizada, apenas será realizada de forma diferente, e em muitos casos, de forma muito mais dinâmica e efetiva com um leque de atuação mais amplo.
 2) Descobrir novos valores (lideres) (18.21). Deve ser uma preocupação do líder, descobrir novos valores. Tomando sempre o cuidado em selecionar as pessoas certas para os lugares certos. Não se deixando levar pela aparência, temperamento, condição cultural ou social e etc. (I Sm16.6). Jetro revela a Moises algumas características essenciais que devem ter uma liderança, ressaltando os valores morais E não intelectuais:

- Homens capazes: 18.21. O texto fala especificidade. Pessoas que demonstram ser adequadas para uma determinada tarefa, talhadas para um determinado perfil. Descobrir esta capacidade é muito importante. Jesus viu em Simão (o nome Simão significa “areia”), traços que poderiam transformá-lo em Pedro (“Petros” significa “pedra”, “rocha”). Jesus usa um trocadilho especial de palavras em Jo 1.42 quando diz: Tu és "Simão” e serás chamado “Pedro”.  Assim ele transforma ou descobre homens com abertura para serem transformados e investe neles. Potencialmente eram homens “capazes”.
- Homens tementes a Deus:  Nem sempre pessoas com perfil de liderança são tementes a Deus. Muitos confiam demasiadamente em suas próprias habilidades e se esquecem que"o temor do Senhor é o Princípio da Sabedoria".
                - Homens de verdade: 18:21 – que amam a verdade e odeiam a mentira, gente que se esquiva da duplicidade, que não aceita dissimulação e cujo caráter seja totalmente confiável. Quando um líder é vítima de desconfiança, sua liderança acabou. Uma das características do líder é que seus liderados confiam nele. É imprescindível a lealdade, a abertura de coração, a confiança, a sinceridade.
                - Homens não avarentos - 18:21 – Homens não compráveis, não subornáveis, não corruptíveis. Eles julgariam as causas do povo, seriam responsáveis pela justiça (magistrados), e quando a magistratura aceita suborno, a justiça deixa de ser aplicada.
Líderes apegados a dinheiro são empecilhos para o Reino de Deus e levam a instituição ao descrédito. Não podem ser avarentos nem mesquinhos, mas devem ter relação saudável com a aplicação de si mesmo e de seus recursos.
                3)  Transfira conhecimento - “Ensina-lhes os estatutos” 18.20
O conhecimento de Moisés e as revelações de Deus deveriam agora se tornar conhecidas a um grupo maior, as leis de Deus precisavam ser analisadas para que cada situação fosse julgada de forma imparcial.
               
CONCLUSÃO
No Reino de Deus não há lugar para individualidade, a liderança não pode ser realizada de forma solitária, pois abre muitos espaços para deformações. O modelo de liderança praticado por Jesus foi de uma liderança claramente descentralizada através de seus discípulos e da própria Igreja primitiva, onde a idéia de equipe estava muito clara (At 20.17). Paulo também nos dá exemplo de liderança compartilhada em (Tt 1.5), quando orienta Tito a formar um Conselho de presbíteros em Creta, para repartir a sua liderança.
 

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